12/11/2019
Admin
Compliance, palavra atualmente muito vista e usada, tem origem na língua inglesa, do verbo to comply, que expressa “agir de acordo com uma regra ou instrução” ou seja, é a conduta em conformidade com as normas externas e internas. Para os mais vividos, assemelha-se a antiga O&M (Organizações e Métodos), só que mais robusta de conteúdo e atividades.
Se em primeiro momento a O&M, de uso e aplicação exclusivamente interno e guardados a sete chaves pelas Corporações, traduzia na organização de fluxos de processos, procedimentos, informações e tomadas de decisões, para fins de atingir a menor perda e maior lucratividade, em segundo momento, a partir da década de 90, com a necessidade de mostrar a sociedade que a empresa possuía um selo de qualidade, ou seja, que seus produtos e/ou serviços respeitavam as normas vigentes, que possuíam um padrão de produção e rastreabilidade, que a legislação vigente e as normas internas da empresa eram rigorosamente cumpridas, ou seja, era o selo da excelência, do politicamente correto e, ajudava a vender, generalizou-se então os diversos programas de qualidade como o ISO-9000, PBQP, 5S, Seis Sigma, TQM, etc...
Recentemente, devido a operação lava jato, muito se tem houvido falar que a empresa A, B, ou C assinou um acordo de compliance com o Ministério Público. É o enfoque do momento.
Tá, mas o que eu, um empregador (rural, empresarial ou mesmo empregador domestico) tenho a ver com isto ?? É simples, lhe explico.
Primeiro, ainda que a aplicação do Compliance se dê nas mais diversas áreas, neste artigo vou tratar exclusivamente da área trabalhista, ou seja, da relação entre o empregador e o empregado.
O senso comum esta impregnado de jargões como: “O funcionário sempre está certo e a empresa é a errada”, “A Justiça do Trabalho só protege o empregado” entre outros. A realidade é que a Justiça do Trabalho sempre foi e é um temor para a maioria dos Empregadores, boa parte disto, culpa dos próprios, seja por não se resguardarem corretamente (é a estória do: “isso não vai acontecer comigo), seja por infelizmente agirem ao arrepio da Lei.
Antes de mais nada, Compliance serve principalmente para proteger o Empregador de eventual lide ou afronta de seu (ex) funcionário, seja no ambiente do trabalho, seja judicialmente.
Se por um lado o Governo Federal fala em reforma das Leis Trabalhistas e sua flexibilização, por outro, vemos a Justiça do Trabalho cada vez mais protecionista aos direitos trabalhistas. Isto é real e preocupante, em apertada síntese demonstro:
Em 24/01/2017, o Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região (TRT-ES) ao julgar o Agr. Inc. nº. 0000570-31.2016.5.17.000 proferiu acórdão referente a sua súmula nº. 42, reconhecendo a vigência da Convenção nº. 158 do OIT. Porém, no dia 02/02/17, fase a repercussão negativa, o TRTES opinou por suspender a vigência da Súmula nº. 42, até ulterior decisão.
Para melhor compreensão, a Súmula é uma referência do entendimento dos Desembargadores do Tribunal frente a determinada problemática, a qual deve ser seguida pelos juízes de primeira instância, ou seja, os juízes das varas da Justiça do Trabalho. Ainda que a Justiça do Trabalho seja composta por 24 Tribunais e a Súmula nº 42 tenha sido originada no TRT da 17ª Região (ES), não raras vezes o entendimento de um Tribunal do Trabalho, através de acórdãos e súmulas, são seguidos pelos demais Tribunais. E no presente caso, a possbilidade do entendimento da Súmula nº. 42 proliferar pelo País afora é real e iminente.
Aos desavisados, a Convenção nº. 158 da OIT, que está sendo discutida no STF pela ADIN nº. 168, trata exclusivamente do fim da demissão sem justa causa. Traz a referida Convenção:
Ainda que a Convenção nº. 158 esteja gatinhando na sua exigência, a conversão de uma demissão por justa causa em, SEM justa causa, pelos Tribunais do Trabalho é grande e se dá, basicamente pela falta ou insuficiência de provas levadas pelo Empregador. A exemplo: TRT 23ª Região (MT), RO-1544-44.2014.5.23.0106 julgado em 03/02/2017: REVERSÃO DA JUSTA CAUSA. ATOS FALTOSOS NÃO COMPROVADOS. A dispensa por justa causa operária é modalidade de extinção do contrato de trabalho que se faz de forma onerosa para o trabalhador. Não provada a falta eleita pela Ré como motivadora da dispensa, não há se falar em justa causa, sendo desnecessária a análise da configuração dos demais requisitos objetivos, subjetivos e circunstanciais que sustentam a dispensa. In casu, os fatos tidos como faltosos não ficaram bem delineados e nenhum deles foi comprovado. Mantida a reversão da justa causa aplicada
Do outro lado, temos as reclamações dos Empregadores quanto ao descomprometimento, assiduidade, uso de celular e redes sociais, vocabulário impróprio, higiene, dentre outras tantas queixas de seus funcionários, ocasionando por conseguinte a alta rotatividade do quadro, a perda de lucratividade, e o aumento de despesas em treinamentos.
É aí, para casos como estes, que se faz necessário ter uma estrutura de Compliance (interna/externa), para desenvolvimento de mecanismos de prevenção e gerenciamento de conflitos.
Em 10/02/2017 o Tribunal Regional do Trabalho do Paraná, confirmou a demissão por Justa Causa de um funcionário por uso excessivo de celular, após o mesmo ter sido expressamente advertido e posteriormente suspenso. Em seu voto, a Des. Relatora Sueli Gil El-Rafihi, justificou:
“Inclui-se no poder diretivo do empregador o estabelecimento de regras e padrões de conduta a serem seguidos pelos seus empregados durante os horários de trabalho, dentre os quais a lícita proibiç ã o do uso de aparelho celular ." (fonte: http://www.trt9.jus.br/internet_base/noticia_crudman.do?evento=Editar&chPlc=6370891 )
Em mais um caso recente de Compliance, o Hospital Sírio-Libanês demitiu por justa causa a médica reumatologista Gabriela Munhoz após esta ter compartilhado dados do estado de saúde da Dona Marisa, esposa do ex-presidente Lula. Detalhe. Em reportagem veiculada no Fantástico no dia 12/02/2017, o Hospital justificou a demissão em razão da médica haver infringido o Código de Postura e Conduta do Hospital. Observem, em momento algum foi citado o Código de Ética Médico (Resolução CFM nº. 1931/09).
A implantação de uma estrutura de Compliance (interna ou externa) é lícita e necessária para o estabelecer um relacionamento ético e harmonioso no ambiente de trabalho, bem como para que o Empregador possa se defender diante de uma conduta não aceita, seja de âmbito interno ou externo. Ademais, um ambiente de trabalho com regras claras e precisas, produz um meio seguro, do ponto de vista moral, traduzindo-se em confiança e satisfação dos funcionários, com tendência ao aumento da produtividade e propagação da boa imagem do empregador.
Um programa de compliance trabalhista bem implantado e executado é o caminho viável para alcançar este objetivo.
Autoria: Sandra Corrêa de Mello
Advogada
OAB-MT 9563
Sócio da Quintella & Mello Advogados Associados
Outubro/2017